O amor é prepotente: sempre acreditamos poder transformar e corrigir o objeto amado.
Por: Contardo Calligaris*
"My Fair Lady" é um clássico, que encena fantasias que habitam a mente de todos nós.
A história é conhecida: o professor Higgins encontra uma pobre vendedora de flores, estigmatizada por suas maneiras, sua gramática e sua pronúncia. Ele aposta que a transformará em uma "lady" com um curso intensivo de poucos meses. O mesmo professor, celibatário rabugento, aproveitará o curso para aprender algo sobre sentimentos. Como nota Jorge Takla no programa do espetáculo, "My Fair Lady" é uma "Cinderela" em que acontece uma troca extraordinária entre um homem e uma mulher, cada um transformando o outro. Voltemos ao mito que inspirou Bernard Shaw.
Pigmalião era um escultor que se apaixonou perdidamente pela figura feminina que ele mesmo tinha esculpido. Afrodite ouviu suas súplicas e deu vida à estátua. Não se sabe se Pigmalião ficou feliz com essa dádiva ou se, ao longo do tempo, ele lamentou a época em que sua amada não tinha vida própria.
Detalhe inquietante: Pigmalião criou a estátua e se apaixonou por ela porque desgostava das mulheres reais, que lhe pareciam indecentes (animadas por desejos autônomos).
A psicologia clínica usa o termo "pigmalionismo" para designar 1) a conduta erótica, um pouco estranha, de quem se apaixona por estátuas e as deseja; 2) num sentido mais amplo, a paixão pedagógica e erótica do sujeito que sonha com um objeto de amor e desejo que ele mesmo moldaria.
A psicologia experimental, nas últimas décadas, confirmou e debateu o "efeito Pigmalião": quando os professores esperam um grande progresso de seus alunos, os alunos progridem duas vezes mais rápido.
O desempenho do aluno é proporcional às expectativas do professor. Aos 20 anos, leitor assíduo de Ronald Laing e devoto da antipsiquiatria italiana, eu devaneava que, um dia, encontraria uma jovem esquizofrênica e catatônica: pela mágica de meus cuidados, eu lhe devolveria a fala e a vida. No processo, eu me apaixonaria por ela, e ela por mim; viveríamos felizes para sempre. Portanto, confesso: já fui pigmalionista e já apostei na força curativa do "efeito Pigmalião". Mas a história de Pigmalião não se aplica apenas em casos de extremismo pedagógico e terapêutico.
Qualquer um de nós desejou e deseja transformar o objeto amado. O amor é prepotente: idealizamos o outro e acreditamos firme que ele ou ela se emendarão.
Somos convencidos de que o outro amado carrega todas as qualidades que nossa paixão lhe atribui: elas estão escondidas, atrás de uma "deformação" que será corrigida pela virtude de nosso amor. Com isso, o amor desafia diferenças extremas, étnicas, culturais, religiosas e sociais.
"My Fair Lady" é um clássico, que encena fantasias que habitam a mente de todos nós.
A história é conhecida: o professor Higgins encontra uma pobre vendedora de flores, estigmatizada por suas maneiras, sua gramática e sua pronúncia. Ele aposta que a transformará em uma "lady" com um curso intensivo de poucos meses. O mesmo professor, celibatário rabugento, aproveitará o curso para aprender algo sobre sentimentos. Como nota Jorge Takla no programa do espetáculo, "My Fair Lady" é uma "Cinderela" em que acontece uma troca extraordinária entre um homem e uma mulher, cada um transformando o outro. Voltemos ao mito que inspirou Bernard Shaw.
Pigmalião era um escultor que se apaixonou perdidamente pela figura feminina que ele mesmo tinha esculpido. Afrodite ouviu suas súplicas e deu vida à estátua. Não se sabe se Pigmalião ficou feliz com essa dádiva ou se, ao longo do tempo, ele lamentou a época em que sua amada não tinha vida própria.
Detalhe inquietante: Pigmalião criou a estátua e se apaixonou por ela porque desgostava das mulheres reais, que lhe pareciam indecentes (animadas por desejos autônomos).
A psicologia clínica usa o termo "pigmalionismo" para designar 1) a conduta erótica, um pouco estranha, de quem se apaixona por estátuas e as deseja; 2) num sentido mais amplo, a paixão pedagógica e erótica do sujeito que sonha com um objeto de amor e desejo que ele mesmo moldaria.
A psicologia experimental, nas últimas décadas, confirmou e debateu o "efeito Pigmalião": quando os professores esperam um grande progresso de seus alunos, os alunos progridem duas vezes mais rápido.
O desempenho do aluno é proporcional às expectativas do professor. Aos 20 anos, leitor assíduo de Ronald Laing e devoto da antipsiquiatria italiana, eu devaneava que, um dia, encontraria uma jovem esquizofrênica e catatônica: pela mágica de meus cuidados, eu lhe devolveria a fala e a vida. No processo, eu me apaixonaria por ela, e ela por mim; viveríamos felizes para sempre. Portanto, confesso: já fui pigmalionista e já apostei na força curativa do "efeito Pigmalião". Mas a história de Pigmalião não se aplica apenas em casos de extremismo pedagógico e terapêutico.
Qualquer um de nós desejou e deseja transformar o objeto amado. O amor é prepotente: idealizamos o outro e acreditamos firme que ele ou ela se emendarão.
Somos convencidos de que o outro amado carrega todas as qualidades que nossa paixão lhe atribui: elas estão escondidas, atrás de uma "deformação" que será corrigida pela virtude de nosso amor. Com isso, o amor desafia diferenças extremas, étnicas, culturais, religiosas e sociais.
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(*) CONTARDO CALLIGARIS é psicanalista, italiano, doutor em psicologia clínica e colunista da Folha de São Paulo.
Para ler o texto completo clique: http://psifaa2.blogspot.com/
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Um comentário:
AMAR É A INICIAÇÃO DA ETERNIDADE
NADA MAIS DECLARO SOBRE O AMOR
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